sábado, 22 de maio de 2010

Ferida

Sabe quando eu era pequena e brincava na rua? Voltava quase sempre ralada, com o joelho machucado, ou o pé faltando um pedaço. Tudo fruto das estripulias, das muitas brincadeiras com todo mundo, do skate, do subir nas árvores, do jogar taco, esconde-esconde, pega-pega...

Muitas vezes eu chorava pra fazer curativos e os machucados realmente doíam bastante. Por vários anos eu tive as pernas cheias de pequenas cicatrizes e “casquinhas” secas nas feridas. E às vezes eu nem me lembrava mais do machucado, mas alguém perguntava “onde você se machucou?” e ele doía novamente. Ou então eu mesma esbarrava em algum lugar, a casquinha saía do lugar e o sangue saía outra vez.

É assim que tenho estado, mãe. Você é tão viva em mim que eu consigo conversar com você várias vezes durante o dia, como se estivéssemos lado a lado. Mas de repente alguém liga e pergunta como estou vivendo, ou me encontro em situações que me dão vontade de ir correndo te encontrar, contar as coisas, saber sua opinião, mas não te encontro. Aí a dor volta fortemente. Aí são muitas as lembranças, uma batalha interior se trava e o sangue pinga sem parar.

Dia após dia. Com muito custo consigo deixar a dor quietinha, “adormecida”, penso em outras coisas, procuro viver a vida. E então um outro fato, uma pessoa, às vezes um prato de comida, uma palestra, uma pergunta infeliz de alguém arrancam a casca e me fazem lembrar da dor, do suplício.

Às vezes tenho vontade de fugir. De entrar numa caverna, tomar um sonífero e dormir por 30 anos. Quem sabe, depois de 30 anos, o coração esteja um pouco mais acostumado... Quem sabe, pelo menos dormindo, ninguém se ache no direito de ficar perguntando, cutucando, invadindo... Quem sabe, dormindo eu passe 30 anos sonhando com você e vivendo ao seu lado novamente...

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